
Em OFF
com Marcela Mendes
A história começou cedo, aos três anos, como tantas meninas que entram no ballet ainda na infância. Mas, para ela, a dança foi muito mais do que uma atividade extracurricular: tornou-se parte da constituição de quem é como pessoa, mulher e profissional. Cada atravessamento, aprendizado, encantamento e até questionamento vivido nos palcos e salas de aula moldou sua forma de sentir e se expressar no mundo.
Hoje, mesmo sem dançar profissionalmente, ela continua a dançar — não por obrigação, mas por amor. “É quando executo os movimentos que me sinto mais genuinamente eu”, afirma.
Psicologia e dança: dois caminhos que se cruzam
A escolha profissional pela psicologia não a afastou da dança. Pelo contrário, acabou unindo duas áreas que, à primeira vista, podem parecer distantes, mas que compartilham muito: ritmo, movimento, superação, história, expressão e desafios humanos.
Essa relação aparece em seus projetos, pesquisas e na clínica, como se cada metáfora da dança fosse também uma metáfora da vida. “Até para quem não dança, é possível fazer associações sobre as nuances do movimento. A psicologia e a dança se complementam.”

A dança como organização emocional
Durante a adolescência — fase marcada por mudanças intensas — a dança funcionava como refúgio. O alongamento antes da aula era quase um ritual meditativo, capaz de reorganizar pensamentos e sentimentos em meio ao caos interno.
Hoje, adulta, ela reconhece que a dança ainda ocupa esse lugar: um espaço de apoio, criatividade, presença e conexão com o agora. “Num mundo rápido, digitalizado e de trocas efêmeras, estar em sintonia com o momento presente através da dança é transformador.”

A preservação emocional como base da arte
Para ela, preservar-se emocionalmente na dança é tão essencial quanto cuidar do corpo. A disciplina, a exposição e a entrega que a arte exige só são sustentáveis quando existe um solo interno firme. Esse cuidado passa por acolher emoções durante processos criativos, lidar com críticas e comparações, e lembrar que o valor de um artista não se mede apenas pela técnica, mas pela inteireza de seu ser.

A individuação em cena
Na psicologia analítica Junguiana, fala-se sobre o caminho de individuação — o processo de tornar-se quem realmente se é, em autenticidade. Na dança, esse caminho se manifesta quando o bailarino dança com a alma, sem perder a conexão com sua verdade interior.
“Preservar-se emocionalmente é um ato de coragem e amor próprio. É o que sustenta a arte viva e pulsante, e não apenas performada.”
Entre corpo e alma, técnica e emoção, a dança continua sendo esse lugar de encontro profundo consigo mesma — e de inspiração para todos que acreditam na arte como caminho de transformação.