Em Off com Luca

Em OFF
com Luca

Entrar no balé por causa das sapatilhas de pontas foi apenas o início de uma trajetória marcada por coragem e reinvenção. A conquista de dançar nas pontas em uma companhia profissional não veio fácil — foi resultado de estratégias, resistência e uma luta constante por reconhecimento.

O sonho das pontas e o caminho até a companhia

Durante a pandemia, o desejo encontrou oportunidade: foi nesse período que surgiu a chance de seguir os estudos online com o projeto internacional Males on Pointe. Para isso, veio a compra de uma sapatilha Lisse da Evidence, que se tornou mais do que um acessório — virou símbolo de persistência.

No projeto, houve contato direto com grandes artistas do Les Ballets Trockadero, Ballet de l’Opéra de Lyon e Ballet 22. Foi dessa convivência que nasceu ainda mais garra para romper barreiras e fazer diferença no Brasil.

Depois de diversas audições, veio a aprovação na Intuição Cia de Dança, onde o acolhimento se tornou tão marcante quanto o palco. “Não foi nada fácil. Precisei falar muito e resistir ainda mais para conquistar respeito em um meio ainda binário, cisgênero e majoritariamente branco. Ser a primeira trans a dançar nas pontas foi grandioso — não apenas para mim, mas como exemplo para muitas outras pessoas que lutam para estar nesses lugares.”

Ballroom: corpo, arte e resistência

Mais do que uma referência estética, a cultura ballroom é uma expressão política e um espaço de resistência. Nascida no Harlem dos anos 1960, entre a comunidade preta e latina LGBTQIAPN+, a ballroom ofereceu acolhimento a corpos historicamente excluídos.

No Brasil, tornou-se sinônimo de diversidade e luta. “A ballroom é o que eu sou e o que meu corpo expressa. Foi através dela que conquistei o CUNT — Carisma, Singularidade, Coragem e Talento — para mostrar minha força em cena.”

O artista múltiplo que habita um só corpo

Criatividade sempre foi parte da essência. Além da dança, há uma entrega à cena underground de São Paulo, performances, moda e educação. A multiplicidade de projetos exige organização, mas também traz energia. “Sou inquieto desde criança, sempre tive essa inclinação para a arte. Divido meu tempo entre a companhia, performances independentes e aulas. A moda também entrou na minha vida e hoje faz parte desse equilíbrio criativo. Pode ser cansativo, mas esse ritmo me move e me mantém vivo.”

Arte, resistência e multiplicidade: dançar nas pontas é mais que um gesto técnico — é um manifesto que ecoa para toda uma geração.